Um cadim de tudo que gosto, música, literatura, fotografia e outras coisinhas que me fazem feliz....
segunda-feira, 31 de outubro de 2011
"Teu aniversário, no escuro,
não se comemora.
Escusa de levar-te esta gravata.
Já não tens roupa, nem precisas.
Numa toalha no espaço há o jantar,
mas teu jantar é o silêncio, tua fome não come.
Não mais te peço a mão enrugada
para beijar-lhe as veias grossas.
Nem procuro nos olhos esfriados
aquela interrogação: está chegando?
Em verdade paras te de fazer anos.
Não envelheces. O último retrato
vale para sempre. É um homem cansado
mas fiel: carteira de identidade.
Tua imobilidade é perfeita. Embora a chuva,
o desconforto deste chão. Mas sempre amaste
o duro, o relento, a falta. O frio sente-se
em "mim, que te visito. Em ti, a calma.(...)"
Carlos Drumond de Andrade in: A rosa do povo
domingo, 30 de outubro de 2011
sábado, 29 de outubro de 2011
Dia Nacional do Livro: 29 de outubro. Foi nesse dia, em 1810, que a Real Biblioteca Portuguesa foi transferida para o Brasil, quando então foi fundada a Biblioteca Nacional e esta data escolhida para o DIA NACIONAL DO LIVRO.
O Brasil passou a editar livros a partir de 1808 quando D.João VI fundou a Imprensa Régia e o primeiro livro editado foi "MARÍLIA DE DIRCEU", de Tomás Antônio Gonzaga.
Lira I
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d’ expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela, Graças à minha Estrela!
Tomás Antonio Gonzaga In: Marilia de Dirceu
sexta-feira, 28 de outubro de 2011
"Quando eu morrer não me chores,
Deixo a vida sem sodade;
- Mandu sarará,
Tive pro pai o desterro,
Por mãe a infelicidade,
- Mandu sarará ...
Papai chegou e me disse:
- Não hás de ter um amor!
- Mandu sarará,
Mamãe veio e me botou
Um colar feito de dor,
- Mandu sarará ...
Que o tatu prepare a cova
Dos seus dentes desdentados,
- Mandu sarará ...
Para o mais desinfeliz
De todos os desgraçados,
- Mandu sarará ..."
Mario de Andrade In: Macunaíma
Deixo a vida sem sodade;
- Mandu sarará,
Tive pro pai o desterro,
Por mãe a infelicidade,
- Mandu sarará ...
Papai chegou e me disse:
- Não hás de ter um amor!
- Mandu sarará,
Mamãe veio e me botou
Um colar feito de dor,
- Mandu sarará ...
Que o tatu prepare a cova
Dos seus dentes desdentados,
- Mandu sarará ...
Para o mais desinfeliz
De todos os desgraçados,
- Mandu sarará ..."
Mario de Andrade In: Macunaíma
(…)O tempo presente e o tempo passado
Estão ambos talvez presentes no tempo futuro,
E o tempo futuro contido no tempo passado.
Se todo o tempo é eternamente presente
Todo o tempo é irredimível.
O que podia ter sido é uma abstração
Que permanece, perpétua possibilidade,
Num mundo apenas de especulação.
O que poderia ter sido e o que foi
Convergem para um só fim, que é sempre presente.
Ecoam passos na memória
Ao longo das galerias que não percorremos
Em direção à porta que nunca abrimos
Para o roseiral. Assim ecoam minhas palavras
Em tua lembrança.
Mas com que fim
Perturbam elas a poeira sobre uma taça de pétalas,
Não sei.
(…)
T.S.Eliot In: Quatro Quartetos
Estão ambos talvez presentes no tempo futuro,
E o tempo futuro contido no tempo passado.
Se todo o tempo é eternamente presente
Todo o tempo é irredimível.
O que podia ter sido é uma abstração
Que permanece, perpétua possibilidade,
Num mundo apenas de especulação.
O que poderia ter sido e o que foi
Convergem para um só fim, que é sempre presente.
Ecoam passos na memória
Ao longo das galerias que não percorremos
Em direção à porta que nunca abrimos
Para o roseiral. Assim ecoam minhas palavras
Em tua lembrança.
Mas com que fim
Perturbam elas a poeira sobre uma taça de pétalas,
Não sei.
(…)
T.S.Eliot In: Quatro Quartetos
quinta-feira, 27 de outubro de 2011
Num sotão que inventei, ou que existia,
criei bichos-de-seda em velhas caixas:
ofício repugnante, que eu amava.
Lembro a inquietação dos vermes, lembro a trama
dos fios, lembro o medo
que chamava lá da escada.
Hoje, num sotão mais noturno,
no último degrau dos meus terrores,
deito-me no pó entre os meus anjos
amortalhados em caixas vazias,
junto da cadeira alta, com as roupas
com que na infância mefingi rainha.
Nela senta-se a Dona dos Enigmas
e me recobre com os fios grudentos
que vão sesoltando deseus olhos.
Lya Luft
criei bichos-de-seda em velhas caixas:
ofício repugnante, que eu amava.
Lembro a inquietação dos vermes, lembro a trama
dos fios, lembro o medo
que chamava lá da escada.
Hoje, num sotão mais noturno,
no último degrau dos meus terrores,
deito-me no pó entre os meus anjos
amortalhados em caixas vazias,
junto da cadeira alta, com as roupas
com que na infância mefingi rainha.
Nela senta-se a Dona dos Enigmas
e me recobre com os fios grudentos
que vão sesoltando deseus olhos.
Lya Luft
"Na vida nem tudo é sofrimento, esterilidade e solidão. A dor faz parte, mas há momentos de magia para todos. Da pessoa mais simples ao mais refinado intelectual, qualquer um pode descobri-los, ou persegui-los, quando a correria, os compromissos, as pressões lhe derem um pouco de paz. Ou ela terá de ser conquistada usando-se garras, dentes, cotovelos."
Lya Luft
Lya Luft
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
Adiamento
Depois de amanhã, sim, só depois de amanhã...
Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã,
E assim será possível; mas hoje não...
Não, hoje nada; hoje não posso.
A persistência confusa da minha subjetividade objetiva,
O sono da minha vida real, intercalado,
O cansaço antecipado e infinito,
Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico...
Esta espécie de alma...
Só depois de amanhã...
Hoje quero preparar-me,
Quero preparar-rne para pensar amanhã no dia seguinte...
Ele é que é decisivo.
Tenho já o plano traçado; mas não, hoje não traço planos...
Amanhã é o dia dos planos.
Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o rnundo;
Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã...
Tenho vontade de chorar,
Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro...
Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo.
Só depois de amanhã...
Quando era criança o circo de domingo divertia-rne toda a semana.
Hoje só me diverte o circo de domingo de toda a semana da minha infância...
Depois de amanhã serei outro,
A minha vida triunfar-se-á,
Todas as minhas qualidades reais de inteligente, lido e prático
Serão convocadas por um edital...
Mas por um edital de amanhã...
Hoje quero dormir, redigirei amanhã...
Por hoje, qual é o espetáculo que me repetiria a infância?
Mesmo para eu comprar os bilhetes amanhã,
Que depois de amanhã é que está bem o espetáculo...
Antes, não...
Depois de amanhã terei a pose pública que amanhã estudarei.
Depois de amanhã serei finalmente o que hoje não posso nunca ser.
Só depois de amanhã...
Tenho sono como o frio de um cão vadio.
Tenho muito sono.
Amanhã te direi as palavras, ou depois de amanhã...
Sim, talvez só depois de amanhã...
O porvir...
Sim, o porvir...
Alvaro de Campos
Depois de amanhã, sim, só depois de amanhã...
Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã,
E assim será possível; mas hoje não...
Não, hoje nada; hoje não posso.
A persistência confusa da minha subjetividade objetiva,
O sono da minha vida real, intercalado,
O cansaço antecipado e infinito,
Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico...
Esta espécie de alma...
Só depois de amanhã...
Hoje quero preparar-me,
Quero preparar-rne para pensar amanhã no dia seguinte...
Ele é que é decisivo.
Tenho já o plano traçado; mas não, hoje não traço planos...
Amanhã é o dia dos planos.
Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o rnundo;
Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã...
Tenho vontade de chorar,
Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro...
Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo.
Só depois de amanhã...
Quando era criança o circo de domingo divertia-rne toda a semana.
Hoje só me diverte o circo de domingo de toda a semana da minha infância...
Depois de amanhã serei outro,
A minha vida triunfar-se-á,
Todas as minhas qualidades reais de inteligente, lido e prático
Serão convocadas por um edital...
Mas por um edital de amanhã...
Hoje quero dormir, redigirei amanhã...
Por hoje, qual é o espetáculo que me repetiria a infância?
Mesmo para eu comprar os bilhetes amanhã,
Que depois de amanhã é que está bem o espetáculo...
Antes, não...
Depois de amanhã terei a pose pública que amanhã estudarei.
Depois de amanhã serei finalmente o que hoje não posso nunca ser.
Só depois de amanhã...
Tenho sono como o frio de um cão vadio.
Tenho muito sono.
Amanhã te direi as palavras, ou depois de amanhã...
Sim, talvez só depois de amanhã...
O porvir...
Sim, o porvir...
Alvaro de Campos
Não:devagar
Devagar,porque não sei
Onde quero ir.
Há entre mim e os meus passos
uma divergência instintiva.
Há entre quem sou e estou
Uma diferença de verbo
Que corresponde à realidade.
Devagar...
Sim,devagar...
Quero pensar no que quer dizer
este devagar...
Talvez o mundo exterior tenha pressa de mais.
Talvez a alma vulgar queira chegar mais cedo.
Talvez a impressão dos momentos seja muito próxima...
talvez isso tudo...
Mas o que me preocupa é esta palavra:devagar...
O que é que tem ser devagar?
Se calhar o universo...
A verdade manda Deus que se diga.
Mas ouviu alguém isso a Deus?
Álvaro de Campos
Mas eu
"Mas eu, em cuja alma se refletem
As forças todas do universo,
Em cuja reflexão emotiva e sacudida
Minuto a minuto, emoção a emoção,
Coisas antagônicas e absurdas se sucedem —
Eu o foco inútil de todas as realidades,
Eu o fantasma nascido de todas as sensações,
Eu o abstrato, eu o projetado no écran,
Eu a mulher legítima e triste do Conjunto
Eu sofro ser eu através disto tudo como ter sede sem ser de água."
Álvaro de Campos
"Mas eu, em cuja alma se refletem
As forças todas do universo,
Em cuja reflexão emotiva e sacudida
Minuto a minuto, emoção a emoção,
Coisas antagônicas e absurdas se sucedem —
Eu o foco inútil de todas as realidades,
Eu o fantasma nascido de todas as sensações,
Eu o abstrato, eu o projetado no écran,
Eu a mulher legítima e triste do Conjunto
Eu sofro ser eu através disto tudo como ter sede sem ser de água."
Álvaro de Campos
terça-feira, 25 de outubro de 2011
CANTIGA
"Ai cigana, ciganinha,
ciganinha,meu amor."
Quando escutei essa cantiga
era hora do almoço, há muitos anos.
A voz da mulher cantando vinha de uma cozinha,
ai ciganinha, a voz de bambu rachado
continua tinindo, esganiçada,linda,
viaja pra dentro de mim, vai polindo o cristal,
canta mais, canta que eu acho minha mãe,
meu vestido estampado, meu pai tirando bóia da panela,
canta que eu acho minha vida.
Adélia Prado In: Bagagem
"Ai cigana, ciganinha,
ciganinha,meu amor."
Quando escutei essa cantiga
era hora do almoço, há muitos anos.
A voz da mulher cantando vinha de uma cozinha,
ai ciganinha, a voz de bambu rachado
continua tinindo, esganiçada,linda,
viaja pra dentro de mim, vai polindo o cristal,
canta mais, canta que eu acho minha mãe,
meu vestido estampado, meu pai tirando bóia da panela,
canta que eu acho minha vida.
Adélia Prado In: Bagagem
Felicidade
A doce tarde morre. E tão mansa
Ela esmorece,
Tão lentamente no céu de prece,
Que assim parece, toda repouso,
Como um suspiro de extinto gozo
De uma profunda, longa esperança
Que, enfim cumprida, morre, descansa...
E enquanto a mansa tarde agoniza,
Por entre a névoa fria do mar
Toda a minh'alma foge na brisa:
Tenho vontade de me matar!
Oh, ter vontade de se matar...
Bem sei é cousa que não se diz.
Que mais a vida me pode dar?
Sou tão feliz!
- Vem, noite mansa...
Manuel Bandeira
In Estrela da Vida Inteira
Eu vi uma rosa
- Uma rosa branca -
Sozinha no galho.
No galho? Sozinha
No jardim, na rua
Sozinha no mundo.
Em torno, no entanto,
Ao sol de meio dia,
Toda a natureza
Em formas e cores
E sons esplendia.
Tudo isso era excesso.
A graça essencial,
Mistério inefável
- Sobrenatural -
Da vida e do mundo,
Estava ali na rosa
Sozinha no galho.
Sozinha no tempo.
Tão pura e modesta,
Tão perto do chão,
Tão longe da glória
Da mística altura,
Dir-se-ia que ouvisse
Do arcanjo invisível
As palavras santas
De outra Anunciação.
Manuel Bandeira
"E haverá momentos em que esse osso duro se transformará numa espécie de coroa de arame farpado sobre tua cabeça, em garras, ratoeira e tenazes no teu coração. Atravessarás o dia fazendo coisas como tirar a poeira de livros antigos e velhos discos, como se não houvesse nada mais importante a fazer.
E caminharás devagar pela casa, molhando as plantas e abrindo janelas para que sopre esse vento que deve levar embora memórias e cansaços. Contarás nos dedos os dias que faltam para que termine o ano, não são muitos, pensarás com alívio.
E morbidamente talvez enumeres todas as vezes que a loucura, a morte, a fome,a doença, a violência e o desespero roçaram teus ombros e os de teus amigos.
Serão tantas que desistirás de contar. Então fingirás - aplicadamente, fingirás acreditar que no próximo ano tudo será diferente, que as coisas sempre se renovam. Embora saibas que há perdas realmente irreparáveis e que um braço amputado jamais se reconstituirá sozinho. Achando graça, pensarás com inveja na largatixa, regenerando sua própria cauda cortada.(...)"
Caio Fernando Abreu In: "Requiem para um rapaz triste"
E caminharás devagar pela casa, molhando as plantas e abrindo janelas para que sopre esse vento que deve levar embora memórias e cansaços. Contarás nos dedos os dias que faltam para que termine o ano, não são muitos, pensarás com alívio.
E morbidamente talvez enumeres todas as vezes que a loucura, a morte, a fome,a doença, a violência e o desespero roçaram teus ombros e os de teus amigos.
Serão tantas que desistirás de contar. Então fingirás - aplicadamente, fingirás acreditar que no próximo ano tudo será diferente, que as coisas sempre se renovam. Embora saibas que há perdas realmente irreparáveis e que um braço amputado jamais se reconstituirá sozinho. Achando graça, pensarás com inveja na largatixa, regenerando sua própria cauda cortada.(...)"
Caio Fernando Abreu In: "Requiem para um rapaz triste"
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
domingo, 23 de outubro de 2011
"... Aprendi, outro dia que perdoar
é a junção de " per " com "doar".
Doar é mais do que dar.
Doar é a entrega total do outro.
O prefixo "per" que tem várias acepções,
indica movimento no sentido "de"
ou em "direção" a ou "através"
ou "para" etimologicamente falando,
portanto, perdoar,
quer dizer doar ao outro
a possibilidade de que ele possa amar,
possa doar-se.
Não apenas quem perdoa
que se"doa através do outro".
Perdoar implica abrir possibilidades
de amor para quem foi perdoado,
através da doação oferecida
por quem foi agravado.
Perdoar é a única forma de facilitar
ao outro a própria salvação.
Doar é mais do que dar: é a entrega total ...
Perdoar é doar o amor,
é permitir que a pessoa objeto do perdão
possa também devolver um amor
que, até então, só negara ...
Ferreira Gullar
é a junção de " per " com "doar".
Doar é mais do que dar.
Doar é a entrega total do outro.
O prefixo "per" que tem várias acepções,
indica movimento no sentido "de"
ou em "direção" a ou "através"
ou "para" etimologicamente falando,
portanto, perdoar,
quer dizer doar ao outro
a possibilidade de que ele possa amar,
possa doar-se.
Não apenas quem perdoa
que se"doa através do outro".
Perdoar implica abrir possibilidades
de amor para quem foi perdoado,
através da doação oferecida
por quem foi agravado.
Perdoar é a única forma de facilitar
ao outro a própria salvação.
Doar é mais do que dar: é a entrega total ...
Perdoar é doar o amor,
é permitir que a pessoa objeto do perdão
possa também devolver um amor
que, até então, só negara ...
Ferreira Gullar
Em Paz
Já bem perto do ocaso, eu te bendigo, ó Vida,
porque nunca me deste esperança mentida
nem trabalhos injustos, nem pena imerecida.
Porque vejo, ao final de tão rude jornada,
que a minha sorte foi por mim mesmo traçada;
que, se extraí os doces méis ou o fel das cousas,
foi porque as adocei ou as fiz amargosas:
quando eu plantei roseiras, eu colhi sempre rosas.
Decerto, aos meus ardores, vai suceder o inverno:
mas tu não me disseste que maio fosse eterno!
Longas achei, confesso, minhas noites de penas;
mas não me prometeste noites boas, apenas,
e em troca tive algumas santamente serenas…
Fui amado, afagou-me o Sol. Para que mais?
Vida, nada me deves. Vida, estamos em paz!
Amado Nervo
porque nunca me deste esperança mentida
nem trabalhos injustos, nem pena imerecida.
Porque vejo, ao final de tão rude jornada,
que a minha sorte foi por mim mesmo traçada;
que, se extraí os doces méis ou o fel das cousas,
foi porque as adocei ou as fiz amargosas:
quando eu plantei roseiras, eu colhi sempre rosas.
Decerto, aos meus ardores, vai suceder o inverno:
mas tu não me disseste que maio fosse eterno!
Longas achei, confesso, minhas noites de penas;
mas não me prometeste noites boas, apenas,
e em troca tive algumas santamente serenas…
Fui amado, afagou-me o Sol. Para que mais?
Vida, nada me deves. Vida, estamos em paz!
Amado Nervo
sábado, 22 de outubro de 2011
sexta-feira, 21 de outubro de 2011
"Podemos falar dos sentimentos, descrever
as impressões que nos ameaçam, e revelar o vazio
que se descobre na ausência um do outro: nada,
porém, é tão inquietante como a dúvida,
o não saber de ti, ouvir o desânimo na tua voz,
agora que a tarde começa a descer e, com ela,
todas as sombras da alma. É verdade que o amor não é
apenas um registro de memórias. É no presente
que temos de o encontrar: aí, onde a tua imagem
se tornou mais real do que tu própria,
mesmo que nada te substitua. Então, é
porque as palavras são supérfluas; mas como viver
sem elas? Como encontrar outra forma de te dizer
que o amor é esta coisa tão estranha, dar o que nunca
se poderá ter, e ter o que está condenado
a perder-se? A não ser que guardemos dentro de nós,
num canto de um e outro a que só nós chegamos,
sabendo que esse pouco que nos pertence é
tudo o que cabe neste sentimento."
Nuno Júdice in: Cartografia de Emoções
as impressões que nos ameaçam, e revelar o vazio
que se descobre na ausência um do outro: nada,
porém, é tão inquietante como a dúvida,
o não saber de ti, ouvir o desânimo na tua voz,
agora que a tarde começa a descer e, com ela,
todas as sombras da alma. É verdade que o amor não é
apenas um registro de memórias. É no presente
que temos de o encontrar: aí, onde a tua imagem
se tornou mais real do que tu própria,
mesmo que nada te substitua. Então, é
porque as palavras são supérfluas; mas como viver
sem elas? Como encontrar outra forma de te dizer
que o amor é esta coisa tão estranha, dar o que nunca
se poderá ter, e ter o que está condenado
a perder-se? A não ser que guardemos dentro de nós,
num canto de um e outro a que só nós chegamos,
sabendo que esse pouco que nos pertence é
tudo o que cabe neste sentimento."
Nuno Júdice in: Cartografia de Emoções
quinta-feira, 20 de outubro de 2011
(In)esperada
Mora dentro de mim
uma vontade não dita
que me detém e vibra
enquanto o milagre
não começa, enquanto
abro todas as janelas
que me lembram as
formas mais belas
de se deixar sorrir.
Então eu me coloco tão aberta,
tão disposta e ereta, esperando
na certa, o amor envelhecer
nos traços de alguém.
Priscila Rôde
Mora dentro de mim
uma vontade não dita
que me detém e vibra
enquanto o milagre
não começa, enquanto
abro todas as janelas
que me lembram as
formas mais belas
de se deixar sorrir.
Então eu me coloco tão aberta,
tão disposta e ereta, esperando
na certa, o amor envelhecer
nos traços de alguém.
Priscila Rôde
quarta-feira, 19 de outubro de 2011
"Você não entende porque a gente chora diante da beleza? A resposta é simples. Ao contemplar a beleza, a alma faz uma súplica de eternidade. Tudo o que a gente ama a gente deseja que permaneça para sempre. Mas tudo o que a gente ama existe sob a marca do tempo. Tudo é efêmero. Efêmero é o por do sol, efêmera é a canção, efêmero é o abraço, efêmera é a casa construída para o resto da vida. A gente chora diante da beleza porque a beleza é uma metáfora da própria vida."
Rubem Alves
Rubem Alves
terça-feira, 18 de outubro de 2011
MINERAÇÃO DO OUTRO
Os cabelos ocultam a verdade.
Como saber, como gerir um corpo alheio?
Os dias consumidos em sua lavra
significam o mesmo que estar morto.
Não o decifras, não, ao peito oferto,
monstruário de fomes enredadas,
ávidas de agressão, dormindo em concha.
Um togue, e eis que a blandícia erra em tormento,
e cada abraço tece além do braço
a teia de problemas gue existir
na pele do existente vai gravando.
Viver-não, viver-sem, como viver
sem conviver, na praça de convites?
Onde avanço, me dou, e o que é sugado
ao mim de mim, em ecos se desmembra;
nem resta mais que indício,
pelos ares lavados,
do gue era amor e, dor agora, é vício.
O corpo em si, mistério: o nu, cortina
de outro corpo, jamais apreendido,
assim como a palavra esconde outra
voz, prima e vera, ausente de sentido.
Amor é compromisso
com algo mais terrível do que amor?
pergunta o amante curvo à noite cega,
e nada lhe responde, ante a magia:
arder a salamandra em chama fria.
Carlos Drumond de Andrade In: Lição de Coisas
Os cabelos ocultam a verdade.
Como saber, como gerir um corpo alheio?
Os dias consumidos em sua lavra
significam o mesmo que estar morto.
Não o decifras, não, ao peito oferto,
monstruário de fomes enredadas,
ávidas de agressão, dormindo em concha.
Um togue, e eis que a blandícia erra em tormento,
e cada abraço tece além do braço
a teia de problemas gue existir
na pele do existente vai gravando.
Viver-não, viver-sem, como viver
sem conviver, na praça de convites?
Onde avanço, me dou, e o que é sugado
ao mim de mim, em ecos se desmembra;
nem resta mais que indício,
pelos ares lavados,
do gue era amor e, dor agora, é vício.
O corpo em si, mistério: o nu, cortina
de outro corpo, jamais apreendido,
assim como a palavra esconde outra
voz, prima e vera, ausente de sentido.
Amor é compromisso
com algo mais terrível do que amor?
pergunta o amante curvo à noite cega,
e nada lhe responde, ante a magia:
arder a salamandra em chama fria.
Carlos Drumond de Andrade In: Lição de Coisas
O NOSSO
Amamos o que não conhecemos, o já perdido.
O bairro que já foi arredores
Os antigos que não nos decepcionaram mais
porque são mito e esplendor.
Os seis volumes de Schopenhauer que jamais terminamos de ler.
A saudade, não a leitura, da segunda parte do Quixote.
O oriente que, na verdade, não existe para o afegão, o persa ou o tártaro.
Os mais velhos com quem não conseguiríamos
conversar durante um quarto de hora.
As mutantes formas da memória, que está feita do esquecido.
Os idiomas que mal deciframos.
Um ou outro verso latino ou saxão que não é mais do que um hábito.
Os amigos que não podem faltar porque já morreram.
O ilimitado nome de Shakespeare.
A mulher que está a nosso lado e que é tão diversa.
O xadrez e a álgebra, que não sei.
Jorge Luis Borges
Amamos o que não conhecemos, o já perdido.
O bairro que já foi arredores
Os antigos que não nos decepcionaram mais
porque são mito e esplendor.
Os seis volumes de Schopenhauer que jamais terminamos de ler.
A saudade, não a leitura, da segunda parte do Quixote.
O oriente que, na verdade, não existe para o afegão, o persa ou o tártaro.
Os mais velhos com quem não conseguiríamos
conversar durante um quarto de hora.
As mutantes formas da memória, que está feita do esquecido.
Os idiomas que mal deciframos.
Um ou outro verso latino ou saxão que não é mais do que um hábito.
Os amigos que não podem faltar porque já morreram.
O ilimitado nome de Shakespeare.
A mulher que está a nosso lado e que é tão diversa.
O xadrez e a álgebra, que não sei.
Jorge Luis Borges
"O senhor é de fora, meu amigo mas meu estranho. Mas, talvez por isto mesmo. Falar com o estranho assim, que bem ouve e logo longe se vai embora, é um segundo proveito: faz do jeito que eu falasse mais mesmo comigo. O senhor escute, me escute mais do que eu estou lhe dizendo. Mire veja: o que é ruim, dentro da gente, a gente perverte sempre por arredar mais de si. Contar é muito, muito dificultoso. Não pelos anos que já passaram. Mas pela astúcia que têm certas coisas passadas – de fazer balancê, de se remexerem dos lugares. O que eu falei foi exato? Foi. Mas teria sido? Agora, acho que nem não. Quanto mais remoto aquilo reside, a lembrança demuda de valor – se transforma, se compõe, em uma espécie de decorrido formoso. Por que era que eu estava procedendo assim? Senhor, sei? Sei que me desconheci. Ah, ânsia que não queria o que de certo queria. O senhor vá pondo seu perceber. Razão por que fiz? Sei ou não sei. De ás, eu pensava claro, acho que de bês não pensei não... aí a confusão e desordem e altos desesperos. O sertão tonteia."
Guimaraes Rosa In: Grande Sertão Veredas
segunda-feira, 17 de outubro de 2011
"Enriqueço na solidão: fico inteligente, graciosa e não esta feia ressentida que me olha do fundo do espelho. Ouço duzentas e noventa e nove vezes o mesmo disco, lembro poesias, dou piruetas, sonho, invento, abro todos os portões e quando vejo a alegria está instalada em mim."
Lygia Fagundes Teles In: As meninas
Lygia Fagundes Teles In: As meninas
"Viva a tua maneira
Não perca a estribeira
Saiba do teu valor
E amanheça brilhando mais forte
Que a estrela do norte
Que a noite entregou
Você é riacho
E acho que teu rio corre pra longe do meu mar
Mar marvado seria o rio
Que correndo do meu riacho
Levaria o que acho
Pra onde ninguém pode achar"
Teatro Mágico
“O que tem de ser, tem muita força. Ninguém precisa se assustar com a distância, os afastamentos que acontecem. Tudo volta! E voltam mais bonitas, mais maduras, voltam quando tem de voltar, voltam quando é pra ser. Acontece que entre o ainda-não-é-hora e nossa-hora-chegou, muita gente se perde. Não se perca, viu?” (Caio Fernando Abreu)
domingo, 16 de outubro de 2011
sábado, 15 de outubro de 2011
Sou professor.
Nasci no momento exato em que uma pergunta saltou da boca de uma criança.Fui muitas pessoas em muitos lugares.Sou Sócrates, estimulando a juventude de Atenas a descobrir novas idéias através de perguntas.Sou Anne Sullivan, extraindo os segredos do universo da mão estendida de Helen Keller.Sou Esopo e Hans Christian Andersen, revelando a verdade através de inúmeras histórias.Sou Marva Collins, lutando pelo direito de toda a criança à Educação.Sou Mary McCloud Bethune, construindo uma grande universidade para meu povo, utilizando caixotes de laranja como escrivaninhas.Sou Bel Kauffman, lutando para colocar em prática o Up Down Staircase.Os nomes daqueles que praticaram minha profissão soam como um corredor da fama para a humanidade...Booker T. Washington, Buda, Confúcio, Ralph Waldo Emerson, Leo Buscaglia, Moisés e Jesus.
Sou também aqueles cujos nomes foram há muito esquecidos, mas cujas lições e o caráter serão sempre lembrados nas realizações de seus alunos.
Tenho chorado de alegria nos casamentos de ex-alunos, gargalhado de júbilo no nascimento de seus filhos e permanecido com a cabeça baixa de pesar e confusão ao lado de suas sepulturas cavadas cedo demais, para corpos jovens demais.
Ao longo de cada dia tenho sido solicitado como ator, amigo, enfermeiro e médico, treinador, descobridor de artigos perdidos, como o que empresta dinheiro, como motorista de táxi, psicólogo, pai substituto, vendedor, político e mantenedor da fé.
A despeito de mapas, gráficos, fórmulas, verbos, histórias e livros, não tenho tido, na verdade, nada o que ensinar, pois meus alunos têm apenas a si próprios para aprender, e eu sei que é preciso o mundo inteiro para dizer a alguém quem ele é... "
(John W. Schlatter)
Nasci no momento exato em que uma pergunta saltou da boca de uma criança.Fui muitas pessoas em muitos lugares.Sou Sócrates, estimulando a juventude de Atenas a descobrir novas idéias através de perguntas.Sou Anne Sullivan, extraindo os segredos do universo da mão estendida de Helen Keller.Sou Esopo e Hans Christian Andersen, revelando a verdade através de inúmeras histórias.Sou Marva Collins, lutando pelo direito de toda a criança à Educação.Sou Mary McCloud Bethune, construindo uma grande universidade para meu povo, utilizando caixotes de laranja como escrivaninhas.Sou Bel Kauffman, lutando para colocar em prática o Up Down Staircase.Os nomes daqueles que praticaram minha profissão soam como um corredor da fama para a humanidade...Booker T. Washington, Buda, Confúcio, Ralph Waldo Emerson, Leo Buscaglia, Moisés e Jesus.
Sou também aqueles cujos nomes foram há muito esquecidos, mas cujas lições e o caráter serão sempre lembrados nas realizações de seus alunos.
Tenho chorado de alegria nos casamentos de ex-alunos, gargalhado de júbilo no nascimento de seus filhos e permanecido com a cabeça baixa de pesar e confusão ao lado de suas sepulturas cavadas cedo demais, para corpos jovens demais.
Ao longo de cada dia tenho sido solicitado como ator, amigo, enfermeiro e médico, treinador, descobridor de artigos perdidos, como o que empresta dinheiro, como motorista de táxi, psicólogo, pai substituto, vendedor, político e mantenedor da fé.
A despeito de mapas, gráficos, fórmulas, verbos, histórias e livros, não tenho tido, na verdade, nada o que ensinar, pois meus alunos têm apenas a si próprios para aprender, e eu sei que é preciso o mundo inteiro para dizer a alguém quem ele é... "
(John W. Schlatter)
sexta-feira, 14 de outubro de 2011
A INVENÇÃO DE UM MODO
Entre paciência e fama quero as duas,
pra envelhecer vergada de motivos.
Imito o andar das velhas de cadeiras duras
e se me surpreendem, explico cheia de verdade:
tô ensaiando. Ninguém acredita
e eu ganho uma hora de juventude.
Quis fazer uma saia longa pra ficar em casa,
a menina disse: “Ora, isso é pras mulheres de São Paulo”
Fico entre montanhas,
entre guarda e vã,
entre branco e branco,
lentes pra proteger de reverberações.
Explicação é para o corpo do morto,
de sua alma eu sei.
Estátua na Igreja e Praça
quero extremada as duas.
Por isso é que eu prevarico e me apanham chorando,
vendo televisão,
ou tirando sorte com quem vou casar.
Porque que tudo que invento já foi dito
nos dois livros que eu li:
as escrituras de Deus,
as escrituras de João.
Tudo é Bíblias. Tudo é Grande Sertão.
Adélia Prado
Entre paciência e fama quero as duas,
pra envelhecer vergada de motivos.
Imito o andar das velhas de cadeiras duras
e se me surpreendem, explico cheia de verdade:
tô ensaiando. Ninguém acredita
e eu ganho uma hora de juventude.
Quis fazer uma saia longa pra ficar em casa,
a menina disse: “Ora, isso é pras mulheres de São Paulo”
Fico entre montanhas,
entre guarda e vã,
entre branco e branco,
lentes pra proteger de reverberações.
Explicação é para o corpo do morto,
de sua alma eu sei.
Estátua na Igreja e Praça
quero extremada as duas.
Por isso é que eu prevarico e me apanham chorando,
vendo televisão,
ou tirando sorte com quem vou casar.
Porque que tudo que invento já foi dito
nos dois livros que eu li:
as escrituras de Deus,
as escrituras de João.
Tudo é Bíblias. Tudo é Grande Sertão.
Adélia Prado
"Nunca mais haverá uma primeira vez, nunca mais a mesma candura de acreditar que tudo aquilo era eterno.Foram-se os amores que tive ou me tiveram: partiram num cortejo silencioso e iluminado.
O tempo me ensinou a não acreditar demais na morte nem desistir da vida: cultivo alegrias num jardim onde estamos eu, os sonhos idos, os velhos amores e seus segredos.
E a esperança - que retrilha como pedrinhas de cores entre as raízes"
Lya Luft - "Paixão" - in Secreta Mirada
O tempo me ensinou a não acreditar demais na morte nem desistir da vida: cultivo alegrias num jardim onde estamos eu, os sonhos idos, os velhos amores e seus segredos.
E a esperança - que retrilha como pedrinhas de cores entre as raízes"
Lya Luft - "Paixão" - in Secreta Mirada
"Olho no poço do teu olho escuro, meia noite em ponto. Quero fazer um feitiço pra que nada mais volte a andar. Quero ficar assim, no parado. Sei com medo que o que trouxe você aqui foi esse me jeito de ir vivendo como quem pula poças de lama, sem cair nelas, mas sei que agora esse jeito se despedaça. Torre fulminada, o inabalável vacila quando começa a brotar de mim isso que não esta completo sem o outro. Você assopra na minha testa. Sou só poeira, me espalho em grãs invisíveis pelos quatro cantos do quarto."
Caio Fernando Abreu "Anotações sobre um amor urbano" in Ovelhas Negras
Caio Fernando Abreu "Anotações sobre um amor urbano" in Ovelhas Negras
quinta-feira, 13 de outubro de 2011
Vivo Sonhando
>"Naquelas horas em que preciso de paz & concentração, corro a colocar João Gilberto na vitrola. Meu preferido é aquele gravado com o sax do Stan Getz.
Agora, para chafurdar numa boa dor-de-cotovelo,com se dizia antigamente, você pode experimentar Billie Holiday,Angela Ro Ro (onde andará?) , Maria Bethânia -
mas só quando chegar na velha e boa Maysa terá certeza< absoluta
que seu mundo caiu."Caio Fernando Abreu
"...A mãe era um estrago de braba, mas quando eu lembro dela me castigando com o safanão do pente na cabeça e me fazendo dois molhos de cachinhos pra eu ir bonita pra escola, me dá um engasgo, uma saudade sem remédio, uma vontade de ser pobre igual antigamente, só pra escutar ela falar: Já ta ficando mocinha, umas roupinhas melhores...e o pai: moça bonita não precisa disso não...
Eh, meu Deus, quanto jeito que tem de ter amor!" Adélia Prado
Nasci para administrar o à-toa
o em vão
o inútil.
Pertenço de fazer imagens.
Opero por semelhanças.
Retiro semelhanças de pessoas com árvores
de pessoas com rãs
de pessoas com pedras
etc etc.
Retiro semelhanças de árvores comigo.
Não tenho habilidade pra clarezas.
Preciso de obter sabedoria vegetal.
(Sabedoria vegetal é receber com naturalidade uma rã no talo.)
E quando esteja apropriado para pedra, terei também sabedoria mineral.
Manoel de Barros
quarta-feira, 12 de outubro de 2011
O Dia das Crianças no Brasil é comemorado hoje, 12 de outubro. Essa data foi "criada" pelo deputado federal Galdino do Valle Filho em 1924 e em 5 de novembro do mesmo ano foi oficializada pelo presidente Arthur Bernardes, através do decreto nº 4867.
Contudo, essa lei em "homenagem" às crianças ficou esquecida, digamos assim, por um tempo. Ela só foi lembrada, em 1960, quando duas empresas - Fábrica de Brinquedos Estrela e Johnson & Johnson - resolveram promover (para aumentar suas vendas, óbvio) a "Semana do Bebê Robusto". A ideia obteve exito e outras empresas de brinquedos a copiaram. Desse modo, resolveram "dedicar" a promoção a um dia único, o 12 de outubro.
Deve ser lembrado que essa data se refere somente ao Brasil.
Para a ONU (Organização das Nações Unidas), o dia no qual se é comemorado o Dia Mundia das Crianças é o 20 de novembro, pois foi nessa data que aconteceu a aprovação da Declaração dos Direitos da Criança.
Fonte: Wikipédia
terça-feira, 11 de outubro de 2011
Silêncio e Palavra
A couraça das palavras
protege o nosso silêncio
e esconde aquilo que somos
Que importa falarmos tanto?
Apenas repetiremos.
Ademais, nem são palavras.
Sons vazios de mensagem,
são como a fria mortalha
do cotidiano morto.
Como pássaros cansados,
que não encontraram pouso
certamente tombarão.
Muitos verões se sucedem:
o tempo madura os frutos,
branqueia nossos cabelos.
Mas o homem noturno espera
a aurora da nossa boca..."
Thiago de Mell
o
A couraça das palavras
protege o nosso silêncio
e esconde aquilo que somos
Que importa falarmos tanto?
Apenas repetiremos.
Ademais, nem são palavras.
Sons vazios de mensagem,
são como a fria mortalha
do cotidiano morto.
Como pássaros cansados,
que não encontraram pouso
certamente tombarão.
Muitos verões se sucedem:
o tempo madura os frutos,
branqueia nossos cabelos.
Mas o homem noturno espera
a aurora da nossa boca..."
Thiago de Mell
o
Ai palavras...
Ai, palavras, ai palavras,
que estranha potência, a vossa!
Ai, palavras, ai palavras,
sois o vento, ides no vento,
e, em tão rápida existência,
tudo se forma e transforma!
Sois de vento, ides no vento,
e quedais, com sorte nova!
Ai, palavras, ai palavras,
que estranha potência, a vossa!
Todo o sentido da vida
principia à vossa porta;
o mel do amor cristaliza
seu perfume em vossa rosa;
sois o sonho e sois audácia,
calúnia, fúria, derrota…
A liberdade das almas,
ai! com letras se elabora…
E dos venenos humanos
sois a mais fina retorta:
frágil como o vidro
e mais que o são poderosa!
Reis, impérios, povos, tempos,
pelo vosso impulso rodam…
Cecília Meireles
que estranha potência, a vossa!
Ai, palavras, ai palavras,
sois o vento, ides no vento,
e, em tão rápida existência,
tudo se forma e transforma!
Sois de vento, ides no vento,
e quedais, com sorte nova!
Ai, palavras, ai palavras,
que estranha potência, a vossa!
Todo o sentido da vida
principia à vossa porta;
o mel do amor cristaliza
seu perfume em vossa rosa;
sois o sonho e sois audácia,
calúnia, fúria, derrota…
A liberdade das almas,
ai! com letras se elabora…
E dos venenos humanos
sois a mais fina retorta:
frágil como o vidro
e mais que o são poderosa!
Reis, impérios, povos, tempos,
pelo vosso impulso rodam…
Cecília Meireles
segunda-feira, 10 de outubro de 2011
Clariceando
"Meu Deus, me dê a coragem de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites, todos vazios de Tua presença. Me dê a coragem de considerar esse vazio como uma plenitude. Faça com que eu seja a Tua amante humilde, entrelaçada a Ti em êxtase. Faça com que eu possa falar com este vazio tremendo e receber como resposta o amor materno que nutre e embala. Faça com que eu tenha a coragem de Te amar, sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo. Faça com que a solidão não me destrua. Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo. Receba em teus braços o meu pecado de pensar."
Clarice Lispector In: Um Sopro de Vida
Clarice Lispector In: Um Sopro de Vida
domingo, 9 de outubro de 2011
FRAGMENTO
Procuro-me por aí
Lugar distante
Compromissado encontro
Onde os olhos não vão
Não me enxergam
Rejeitando-me
Ficam cegos.
Procuro-me por aí
No horizonte
Na margem dos sonhos
Mas a linha sempre foge
E perdida no mesmo espaço
Brindo o abandono.
Procuro-me por aí
De tão perto ficou longe
Enterro-me em busca do centro
E na placa a mensagem:
Procura-se um eu errante.
Helena Sut
Procuro-me por aí
Lugar distante
Compromissado encontro
Onde os olhos não vão
Não me enxergam
Rejeitando-me
Ficam cegos.
Procuro-me por aí
No horizonte
Na margem dos sonhos
Mas a linha sempre foge
E perdida no mesmo espaço
Brindo o abandono.
Procuro-me por aí
De tão perto ficou longe
Enterro-me em busca do centro
E na placa a mensagem:
Procura-se um eu errante.
Helena Sut
“Arrumei os amores, é a primeira regra da vida – saber arquivá-los, entendê-los, contá-los, esquecê-los. Mas ninguém nos diz como se sobrevive ao murchar de um sentimento que não murcha. A amizade só se perde por traição – como a pátria. Num campo de batalha, num terreno de operações. Não há explicações para o desaparecimento do desejo, última e única lição do mais extraordinário amor. Mas quando o amor nasce protegido da erosão do corpo, apenas perfume, contorno, coreografado em redor dos arco-íris dessa animada esperança a que chamamos alma – porque se esfuma? Como é que, de um dia para o outro, a tua voz deixou de me procurar, e eu deixei que a minha vida dispensasse o espelho da tua?”
Inês Pedrosa
Inês Pedrosa
sábado, 8 de outubro de 2011
Uns barcos bordados
No último vestido
Para que venham comigo
As confissões, o riso
Quietude e paixão
De meus amigos.
Porque guardei palavras
Numa grande arca
E as levarei comigo
Peço uns barcos bordados
No último vestido
E vagas
Finas, desenhadas
Manso friso
Como as crianças desenham
Em azul as águas.
Uns barcos
Para a minha volta à Terra:
Este duro exercício
Para o meu espírito.
Hilda Hilst In: Da Morte. Odes Mínimas
No último vestido
Para que venham comigo
As confissões, o riso
Quietude e paixão
De meus amigos.
Porque guardei palavras
Numa grande arca
E as levarei comigo
Peço uns barcos bordados
No último vestido
E vagas
Finas, desenhadas
Manso friso
Como as crianças desenham
Em azul as águas.
Uns barcos
Para a minha volta à Terra:
Este duro exercício
Para o meu espírito.
Hilda Hilst In: Da Morte. Odes Mínimas
sexta-feira, 7 de outubro de 2011
quinta-feira, 6 de outubro de 2011
Meus desejos para todos os dias:
Paciência para as dificuldades,
Tolerância para as diferencias,
Benevolência para os equívocos,
Misericórdias para os erros,
Perdão para as ofensas,
Equilíbrios para os desejos,
Sensatez para as escolhas,
Sensibilidades para os olhos,
Delicadezas para as palavras,
Coragem para as provas,
Fé para as conquistas,
E amor para todas as ocasiões.
E que assim seja...Amém!
Paciência para as dificuldades,
Tolerância para as diferencias,
Benevolência para os equívocos,
Misericórdias para os erros,
Perdão para as ofensas,
Equilíbrios para os desejos,
Sensatez para as escolhas,
Sensibilidades para os olhos,
Delicadezas para as palavras,
Coragem para as provas,
Fé para as conquistas,
E amor para todas as ocasiões.
E que assim seja...Amém!
quarta-feira, 5 de outubro de 2011
"Tantos amigos. Tantos lugares. Tantas frases e livros e sentidos. Tantas pessoas novas. Indo. Vindo. Tenho só um mundo pela frente. E olhe pra ele. Olhe o mundo! É tão pequeno diante de tudo o que sinto. Sofrer dói. Dói e não é pouco. Mas faz um bem danado depois que passa. Mas agora, com sua licença. Não dá mais para ocupar o mesmo espaço. Meu tempo não se mede em relógios. E a vida lá fora, me chama."
Caio Fernando Abreu
terça-feira, 4 de outubro de 2011
segunda-feira, 3 de outubro de 2011
"Um dia nos tiram alguma coisa e não adianta se prevenir, se precaver ou ficar atento. Isso vai acontecer. Ninguém sai da vida inteiro e os que saíram, bom, eu não os conheci. Uma noite você vai estar perdida ou tão despercebida que irão tirar sua intimidade, e acredite: você vai sentir que anda nua por toda a vida. Um dia vão lhe tirar um riso, uma oportunidade, um direito, algo que você mais gosta ou aquilo que você mais preza. Talvez você perceba na hora, talvez você só perceba muito tempo depois. Não quero parecer pessimista, mas a realidade é assim. Acredite no que te digo: o que vão tirar de você é irrecuperável."
(Cáh Morandi)
domingo, 2 de outubro de 2011
Aconteceu...
Aconteceu quando a gente não esperava
Aconteceu sem um sino pra tocar
Aconteceu diferente das histórias
Que os romances e a memória
Têm costume de contar
Aconteceu sem que o chão tivesse estrelas
Aconteceu sem um raio de luar
O nosso amor foi chegando de mansinho
Se espalhou devagarinho
Foi ficando até ficar
Aconteceu sem que o mundo agradecesse
Sem que rosas florescessem
Sem um canto de louvor
Aconteceu sem que houvesse nenhum drama
Só o tempo fez a cama
Como em todo grande amor
" Outro dia me perguntaram qual era o filme da minha vida.Sem pensar muito, hesitando entre Vagas estrelas da Ursa, de Visconti, e Passagem na neblina, de Theo Angelopoulos, respondi: A História de Adèle H., de François Truffaut. Mais tarde, pensando melhor, decidi: o filme da minha vida na verdade é La strada, de Fellini. Nada me comoveu tanto no cinema quanto aquela Gelsomina de Giulietta Masina, misto de clown e pivete, louca e duende...."
Caio Fernando Abreu
sábado, 1 de outubro de 2011
"Me alinhei ao lado dos humildes e descobri que não era bastante humilde para ficar junto deles, falsa a minha curvatura, falso despojamento. Me alinhei ao lado dos fortes e vi que não era suficientemente forte para sustentar por mais tempo aquela arrogância, representava planar sobre os outros porque acreditava que assim não seria esmagada pelo rolo compressor. Teria que subir acima deste rolo,pisar nele - Ah, meu Deus, mas era isso que eu queria?
Não também não era isso. Quis ficar só para ser verdadeira, agora queria apenas ficar só e então sonhei que era uma rainha num coche desgovernado, em vão chamei alguém que eu sabia por perto, onde? E o coche rodando para trás, para os lados, sem cavalos e sem cocheiro. Consegui descer e encontrei uma gata cor-de-mel com seu gatinho, me aproximei enternecida, E o pai?perguntei e apareceu um leão de juba desgrenhada e olhar de pedra.
Corri, tinha uma mulher na casa mas a mulher gesticulava e não podia fazer nada enquanto o leão ia fechando o cerco, acordei com as pisadas na minha retaguarda. Mas quem me detesta tanto assim para me atacar até no sonho? Quis saber e nesse instante vi minha imagem refletida no espelho...."
Ligia Fagundes Teles In: A Disciplina do Amor
Não também não era isso. Quis ficar só para ser verdadeira, agora queria apenas ficar só e então sonhei que era uma rainha num coche desgovernado, em vão chamei alguém que eu sabia por perto, onde? E o coche rodando para trás, para os lados, sem cavalos e sem cocheiro. Consegui descer e encontrei uma gata cor-de-mel com seu gatinho, me aproximei enternecida, E o pai?perguntei e apareceu um leão de juba desgrenhada e olhar de pedra.
Corri, tinha uma mulher na casa mas a mulher gesticulava e não podia fazer nada enquanto o leão ia fechando o cerco, acordei com as pisadas na minha retaguarda. Mas quem me detesta tanto assim para me atacar até no sonho? Quis saber e nesse instante vi minha imagem refletida no espelho...."
Ligia Fagundes Teles In: A Disciplina do Amor
Assinar:
Postagens (Atom)