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segunda-feira, 26 de maio de 2014

AS COISAS

A bengala, as moedas, o chaveiro,
A dócil fechadura, as tardias
Notas que não lerão os poucos dias
Que me restam, os naipes e o tabuleiro,
Um livro e em suas páginas a ofendida
Violeta, monumento de uma tarde,
De certo inesquecível e já esquecida,
O rubro espelho ocidental em que arde
Uma ilusória aurora. Quantas coisas,
Limas, umbrais, atlas e taças, cravos,
Nos servem como tácitos escravos,
Cegas e estranhamente sigilosas!
Durarão muito além de nosso olvido:
E nunca saberão que havemos ido.

Jorge Luis Borges
Possuo ingenuidade besta e sem nenhuma serventia. Uma delas é insistir nas migalhas das lembranças. Desejo bis para o preenchimento dos vazios. Padeço de uma esperança sem eira e nem beira. Sou promessa de um eterno enjoativo. Por vício, hábito ou sei lá o quê, guardo os cacos irrecuperáveis e me perco em horizontes sem fim, buscando respostas inúteis. Sei pouco, costumo inventar e prometer correção para minhas descomposturas. Juro que tudo vai mudar e quando dou por mim descubro que sua canção ainda rima perfeitamente com meus sagrados. 
Lamento apenas essa ilusão. É tarde para outras tentativas. 
Ita Portugal

sexta-feira, 23 de maio de 2014

“É verdade que eu não saberia viver sem a paixão; mas é verdade também que são tão poderosas suas forças na minha alma, que o seu tumulto me mata. Todas as paixões me pervertem. Todas as paixões me convertem. Sobrevivo pela graça de ser poeta” 
LÚCIO CARDOSO (Diário Completo)
#BomDia 
E quantas histórias!!! 

A experiência advém a partir do que vivenciamos! 
ARRISQUE-SE mais! 8-)

sábado, 17 de maio de 2014

Eu não preciso de um motivo especial para ser feliz...felicidade são pedacinhos de ternura que colho aqui e ali.(Cecília Meireles ) 

clariceando...

Porque, às vezes, acordar tem lá suas muitas desvantagens.

Clarice Lispector

Toma o amor guardado entre as conchas da minha mão. Dentro delas ouvi as ondas quebrando-se em pedras e o espetáculo de um pequeno musgo nascido à beira de um raio de sol. Dentro delas, ouvi a terra aninhando sementes e plantas entrelaçando a ponta de suas raízes. Finas raízes tentando sustentar o mundo sob as placas de cimento. As placas de cimento, de onde germinam as casas e crescem as pessoas, entrelaçando a ponta de seus braços e o mais fundo de seus corpos pela noite escura. Dentro delas, ouvi o mundo inteiro tentando ser par... e ouvi a ponta de tuas asas tocando minhas costas nuas, teu instrumento de cordas e suspiros profundos. 

Rita Apoena

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Bem no fundo do sonho estão os sonhos. A cada
Noite quero perder-me nas águas obscuras
Que lavam o dia, mas sob essas puras
Águas que nos concedem o penúltimo Nada
Pulsa na hora cinza o obsceno portento.
Pode ser um espelho com meu rosto distinto,
Pode ser a crescente prisão de um labirinto
Ou um jardim. O pesadelo sempre atento.
Seu horror não é deste mundo. Causa inominada
Alcança-me desde ontens de mito e de neblina;
A imagem detestada perdura na retina
A infama a vigília como a sombra infamada.
Por que brota de mim, quando o corpo repousa
E a alma fica só, esta insensata rosa?

Jorge Luis Borges

sexta-feira, 2 de maio de 2014


 PRECE

Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade....

Mas a chama, que a vida em nós criou,
Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode ergue-la ainda.

Dá o sopro, a aragem - ou desgraça ou ânsia-
Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistaremos a Distância -
Do mar ou outra, mas que seja nossa!

Fernando Pessoa in 'Mensagem'

Foto de PoetaManoelDeBarros.