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domingo, 23 de dezembro de 2012

"Suponha que um anjo bata à sua porta. Não se espante: é final de ano e (...) esta data é propícia ao aparecimento de anjos."

(Caio Fernando Abreu, in: Pequenas Epifanias)
Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.

Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.


Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo : "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.


Alberto Caeiro

"No domingo não ná nada para dizer ou fazer.[...] E dezembro costuma trazer esses t(r)emores, renúncia, palavra brega, sabor pelmex.This is the end."

Caio Fernando de Abreu  in Palavras ao vento - A Vida gritando nos cantos

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

"Mas estou cansada, apesar de minha alegria de hoje, alegria que não se sabe de onde vem, como a da manhãzinha de verão. Estou cansada, agora agudamente!
Vamos chorar juntos, baixinho. Por ter sofrido e continuar tão docemente. A dor cansada
numa lágrima simplificada. Mas agora já é desejo de poesia, isso eu confesso, Deus. Durmamos de mãos dadas. O mundo rola e em alguma parte há coisas que não conheço. Durmamos sobre Deus e o mistério, nave quieta e frágil flutuando sobre o mar, eis o sono."

Clarice Lispector In: Coração Selvagem.

domingo, 16 de dezembro de 2012

"Um homem da aldeia de Neguá, no litoral da Colômbia, conseguiu subir ao céus. Quando voltou, contou. Disse que tinha contemplado, lá do alto, a vida humana. E disse que somos um mar de fogueirinhas. O mundo é isso, revelou. Um montão de gente, um mar de fogueirinhas. Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno que nem percebe o vento e gente de fogo louco que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não iluminam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo".

Eduardo Galeano

domingo, 9 de dezembro de 2012

Quintanares



Saudade
''Via você na janela na distância,
na solidão na penumbra do amanhecer.
Via você na noite, nas estrelas, nos planetas,
nos mares, no brilho do sol e no anoitecer.
Via você no ontem , no hoje, no amanhã...
Mas não via você no momento.
Que saudade...

Mário Quintana

sábado, 8 de dezembro de 2012

“A casa, cujo chão fora batido com seixos do rio quando estes ainda não faltavam, essa velha construção terrosa de que em breve se despediria, tinha para ele o odor da sua própria vida. Da janela, debaixo dum céu velado, as árvores permaneciam imóveis, como que suspensas. Aproveite o dia, aproveite a vida, seja sincero, ele diria, mesmo que, de fora, os outros imaginem com outros olhos como você imagina a si mesmo"...
Luigi Pirandello (1867-1936)

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

" O bom de ter a fé ao alcance dos sonhos e da alma é que, se hoje não deu, amanhã tem mais: mais de mim, mais de nós, mais de tudo o que é vivo, de tudo o que é novo, de tudo o que esbarra em Deus e que a cada instante, sobre todas as coi sas, deixa uns fios de esperança preparando a próxima colheita, o próximo encontro. Não existe nada mais acolhedor que a bonita certeza de tudo passa só pra nos fazer enxergar a tal vida com os olhos sinceros do coração, com os sentidos aguçados e com um amor reinventado que transforma tudo o que vê. Só mesmo a beleza das coisas simples para nos salvar da frieza das coisas mornas."

( Priscila Rôde )

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012



Perder-me em Havana

Queria perder-me nas manhãs,
Nas tardes, nas noites de Havana
Ouvindo salsa, batuque,
Em Malecón, no cais do porto,
Na cidade velha que se
Incendeia afogada em rum
Banhada pelo mar
Perdida, achada - fluídica!
Queria perder-me nas manhãs,
Nas tardes, nas noites de Havana
Ouvindo salsa, batuque
Em Malecón, no cais do porto,
Na cidade velha que se
Desfaz em cores
Em sobressaltos, suspiros,
Ensimesmada e lírica - mágica!
Queria perder-me nas manhãs,
Nas tardes, nas noites de Havana
Ouvindo salsa, batuque,
Em Malecón, no cais do porto,
Na cidade velha que se faz
Fácil, mansa e pervertida,
Pulsando, rindo - chorando!
Queria perder-me nas manhãs,
Nas tardes, nas noites de Havana
Ouvindo salsa, batuque,
Em Malecón, no cais do porto,
Na cidade velha que se
Acorda sonhando a esmo
Sufocada em si mesma,
Em promessas, dúvidas - paixões!
Queria...

Manoel Soares Magalhães